O Tribunal Regional Federal da 5ª Região determinou que os trabalhadores sujeitos ao manuseio ou proximidade de manipulação dos produtos aciclofosfamida e azatioprina — tidos como cancerígenos — têm direito a receber adicional de insalubridade por agente nocivo. Com o julgamento, considerado inédito no país em relação a esses princípios ativos, o TRF 5 ampliou a proteção aos trabalhadores em ambientes de alto risco à saúde.
Isto porque nenhum dos dois produtos faz parte da lista de fármacos do Ministério Público — com o aval de regulamentação do Governo Federal — cujo uso permite às pessoas que os utilizam o direito ao benefício.
A ciclofosfamida (CFM) é um agente vastamente usado para o tratamento de neoplasias malignas e também para combater doenças reumatológicas diversas, mas dependendo da forma como é manipulado pode provocar efeitos colaterais. A azatioprina, por sua vez, é usada como antimetabólito imunossupressor isolado ou, com mais frequência, em combinação com outros agentes (normalmente corticosteroides), em procedimentos que influenciam a resposta imunológica.
No processo em questão, a decisão foi adotada em caráter excepcional, conforme destacou a assessoria do TRF 5. A ação judicial foi movida na origem por um farmacêutico e técnico de laboratório do Hospital Universitário Alcides Carneiro, vinculado à Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), na Paraíba. O servidor manipulava regularmente quimioterápicos antineoplásicos, principalmente esses produtos.
De acordo com o voto do relator, desembargador federal Leonardo Resende, embora não constem nos anexos da norma regulamentadora que lista as substâncias prejudiciais para trabalhadores, uma perícia judicial seguida de parecer técnico da Fundacentro atestou que ambos possuem alto potencial nocivo, equiparando-o aos ativos já previstos na regulamentação.
Conforme afirmou o magistrado, a decisão levou em conta a questão da saúde do trabalhador, diante da “robusta comprovação científica da nocividade das substâncias manipuladas”.
Lacunas normativas
Segundo Resende, “apesar de reconhecer a relevante atribuição da Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTTP), como fórum do Governo Federal responsável por debater temas referentes à segurança e à saúde no trabalho, em situações excepcionais o Judiciário deve atuar para garantir direitos fundamentais como a saúde, mesmo diante de lacunas normativas”.
“O Poder Judiciário não deve deixar de considerar primordialmente, quando robusta a prova científica da condição lesiva dos medicamentos, a violação concreta à saúde do servidor”, frisou.
O voto também levou em conta o que o relator definiu como “ineficácia dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) fornecidos”, que, em sua avaliação, não foram suficientes para neutralizar os riscos enfrentados pelo servidor. Com base neste entendimento, a UFCG foi condenada a implantar o adicional em grau máximo (de 20%) e a pagar ao trabalhador prestações retroativas, respeitando a prescrição quinquenal.
Para juristas, a decisão abre um precedente que pode passar a ser utilizado em outros julgamentos na Justiça Federal em relação ao adicional de insalubridade, tomando-se como referência a análise qualitativa dos agentes de risco, mesmo estes não sendo produtos listados pelas normas do Governo.