O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a anotação positiva em documentos trabalhistas sobre o uso adequado do equipamento de proteção individual (EPI) pelo empregado descaracteriza o risco laboral para fins de reconhecimento de tempo de aposentadoria especial. A exceção é no caso de existirem fortes dúvidas quanto a esse tipo de anotação.
O caso foi analisado recentemente durante o julgamento do Recurso Especial (Resp) 2.082.072. A posição dos ministros sobre o tema, que partiu da 1ª Seção, estabeleceu a jurisprudência sob o rito dos recursos repetitivos — segundo o qual a decisão passa a valer para todos os processos que versam sobre a matéria em tramitação no país.
E definiu que cabe ao trabalhador, autor da ação previdenciária, demonstrar a eventual ineficácia do EPI. Mas sempre que houver divergência ou dúvida quanto ao uso do equipamento, a conclusão dos julgadores terá de ser sempre favorável ao empregado.
Divergências encerradas
A questão submetida a análise teve como objetivo pacificar jurisprudências divergentes sobre a questão. Em primeiro lugar, os ministros avaliaram se a anotação positiva no chamado Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) quanto ao uso do EPI eficaz comprova o afastamento da nocividade de exposição aos agentes químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física dos trabalhadores.
Em segundo lugar, definiram com qual das partes compete o ônus da prova da eficácia do EPI, em caso de contestação judicial da anotação positiva no PPP.
O processo que levou ao julgamento por parte do STJ consistiu num recurso ajuizado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), segundo a qual a anotação positiva do EPI no PPP seria “insuficiente” para descaracterizar o tempo especial de aposentadoria.
Com a posição, o TRF 4 reconheceu o direito do segurado autor da ação a calcular o período de uso do EPI como tempo especial com o argumento de que houve falta de provas que demonstrassem claramente a eliminação do risco laboral.
Por sua vez, o INSS argumentou, nos autos, que “o PPP atesta se há exposição ao agente nocivo, devendo ser considerado para comprovar a eficácia do EPI”. Por isso, de acordo com o instituto, o uso eficaz do equipamento afastaria a contribuição patronal devida à aposentadoria especial.
A relatora do caso no STJ, ministra Maria Thereza de Assis Moura, votou pela reforma da decisão do TRF 4 e pela argumentação do INSS. Ela destacou no seu voto que o Supremo Tribunal Federal (STF), durante o julgamento do Tema 555 da repercussão geral, já se manifestou no sentido de que a indicação de uso adequado do EPI descaracteriza o tempo especial. A exceção é se o segurado produzir prova de que o equipamento não era utilizado ou não era eficaz.
A magistrada também citou entendimento da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) semelhante à do STF. Na TNU os integrantes da Turma afirmaram que “a anotação do uso de EPI no PPP é suficiente para provar a neutralização de agentes nocivos à saúde e a manutenção da integridade física do trabalhador”.
Exigência legal
Conforme o relatório da ministra, na linha do STF e da TNU, “o PPP é uma exigência legal e está sujeito a controle por parte dos trabalhadores e da administração pública, de acordo com a Lei 8.213/1991” — que dispõe sobre planos de benefícios da Previdência Social. “Desconsiderar, de forma geral e irrestrita, as anotações desfavoráveis ao trabalhador é contra a legislação e causa efeitos deletérios à coletividade de trabalhadores”, acrescentou Maria Thereza.
“Dessa forma, a anotação no PPP, em princípio, descaracteriza o tempo especial. Se o segurado discordar, deve desafiar a anotação, fazendo-o de forma clara e específica”, concluiu a relatora.
De acordo com a magistrada, em havendo contestação judicial da anotação positiva no PPP, a comprovação da ineficácia do EPI deve ser ônus processual do segurado, por se tratar de fato constitutivo de seu direito, conforme previsto no Código de Processo Civil.
“Apresentar a prova é mais fácil para o segurado do que para o INSS. Foi o segurado quem manteve relação com a empregadora, conhece o trabalho e tem condições de complementar ou contestar informações constantes no PPP”, frisou.
Tese consolidada
Assim, a 1ª Seção do STJ definiu a seguinte tese sobre o tema (Tema 1.090):
“I – A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II – Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III – Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor”.