Após o pedido de vista do ministro Dias Toffoli, o julgamento no Supremo Tribunal Federal, que discute a exigência de inscrição de advogado público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para o exercício de suas funções públicas, foi suspenso. Já votaram para dispensar a obrigatoriedade do registro na OAB, os ministros Cristiano Zanin (relator), Gilmar Mendes, Flávio Dino, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Os ministros Edson Fachin, André Mendonça e Nunes Marques divergiram do relator e consideraram a medida constitucional. Luiz Fux adotou posição parcial.
O caso chegou ao STF por meio do Recurso Extraordinário (RE 609517), interposto pela OAB contra decisão da Justiça de Rondônia que dispensou um integrante da Advocacia-Geral da União da obrigatoriedade de inscrição na entidade para atuar judicialmente em nome da União. Em 2017, o Supremo reconheceu a repercussão geral do tema (Tema 936), entendendo que a questão ultrapassa os interesses das partes envolvidas e exige uniformização para aplicação pelas demais instâncias judiciárias em todo o país.
Voto do relator
O relator do caso, ministro Cristiano Zanin, que já havia rejeitado o recurso em julgamento virtual, reafirmou o seu voto. Na sua avaliação, a inscrição de advogado público da União deve ser feita voluntariamente. Ou seja, por opção e não por obrigação.
O relator defendeu que seja adotado o mesmo entendimento firmado pelo STF (Tema 1074), que estabeleceu que o defensor público não precisa estar inscrito na OAB para exercer suas funções. Zanin ressaltou que a advocacia pública é disciplinada pela lei complementar 73, enquanto a advocacia privada é regida pelo estatuto da OAB, que é uma lei ordinária.
Inicialmente, Zanin propôs a seguinte tese para o Tema 936 da repercussão geral:
“(i) É inconstitucional a exigência de inscrição do Advogado Público nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, para o exercício das atividades inerentes ao cargo público;
(ii) A inscrição de advogados públicos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil poderá ocorrer de forma voluntária, individualmente, ou mediante ato administrativo a ser firmado entre o órgão de representação estatal e a Ordem dos Advogados do Brasil.”
Seguiram o relator os ministros Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Flávio Dino e Alexandre de Moraes, que sugeriram a retirada do item 2 da tese. Zanin concordou.
Divergência
O ministro Edson Fachin divergiu e votou para aceitar o recurso. Na sua avalição, a exigência de inscrição de advogado público nos quadros da OAB é constitucional. Segundo o ministro, não pode haver uma “cisão” da carreira de advocacia no país. O ministro ressaltou que as duas funções não podem estar divididas entre categorias distintas.
“Todos os advogados do país, sejam públicos ou privados, jamais deixam de ser advogados em razão da aprovação em serviço público para o exercício de função pública”, destacou.
Na mesma linha, os ministros André Mendonça e Nunes Marques votaram para validar a obrigatoriedade: “inexiste inconstitucionalidade na exigência na inscrição de advogados públicos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, uma vez que a vinculação à quadro da administração pública não afasta o pertencimento à classe dos advogados”, afirmou.
O ministro propôs uma segunda tese:
“É constitucional a exigência de advogados nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil inclusive daqueles que exercem a advocacia pública”.
Já o ministro Luiz Fux deu parcial provimento ao recurso.
Sustentações orais
O advogado da União, Lyvan Bispo dos Santos, defendeu a inscrição dos advogados públicos na OAB por entender que advogados públicos e privados exercem as mesmas atividades. Sustentou que todos estão sujeitos à disciplina da profissão, mantendo a mesma essência, com apenas algumas diferenças: o beneficiário, relação profissional e âmbito dessa atuação.
“Nos parece aqui que a Turma Recursal se equivoca ao dizer que há um abismo entre os advogados públicos e privados”, argumentou.
Lyvan ressaltou que, segundo a Constituição, a advocacia pública exerce função essencial à Justiça, ao lado do Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia Privada. E ressaltou que os regimes estatutários das duas atividades podem conviver harmonicamente com o estatuto da OAB.
O representante do Conselho Federal da OAB e procurador do Estado do Ceará, Vicente Martins Prata Braga, defendeu a obrigatoriedade de inscrição na OAB para todos os advogados públicos. Ele argumentou que a única distinção entre a advocacia pública e privada é o cliente que cada uma representa.
“A advocacia é una. Podemos ter prerrogativas e obrigações distintas, mas não podemos nos afastar daquelas previstas no Estatuto da OAB”, afirmou.
Vicente destacou que a advocacia pública municipal não está resguardada pela Constituição. O procurador alertou que se o registro for dispensado, a atividade ficará desprotegida.
“A OAB é a casa de toda a advocacia brasileira” (..) “a OAB que nos protege”, afirmou.
Recurso contra condenação
No recurso (RE 609517), a instituição questiona acórdão da Turma Recursal do Juizado Especial do estado que manteve sentença que condenou a União e a OAB-Rondônia a se absterem de exigir a inscrição, nos quadros da seccional, de um integrante da Advocacia-Geral da União e Juizado Especial da Seção Judiciária daquele Estado.
A decisão contestada reconheceu o direito do advogado público de atuar judicialmente em nome da União independentemente da inscrição na OAB, o que contraria o entendimento defendido pela entidade.
Violação à Constituição
No Supremo, a OAB alega violação aos artigos 131 a 133 da Constituição Federal, que tratam da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria dos Estados e do Distrito Federal, e do papel do advogado na administração da justiça. O argumento é que a Constituição não faz distinção entre a advocacia pública e privada, demonstrando a indispensabilidade e essencialidade de ambas para o funcionamento do sistema de justiça.
A instituição sustenta, ainda, que, conforme a Constituição, “o patamar auferido aos advogados públicos é o mesmo dos advogados privados, ou seja, são essenciais à Justiça”. E que no caso discutido, a Turma Recursal proferiu decisão contrária ao texto constitucional e à jurisprudência dominante do STF.