O Supremo Tribunal Federal analisa no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) n° 1.042.075 RG (Tema 977) um caso que pode transformar as investigações criminais no Brasil, ao definir se dados “estáticos ou em trânsito” armazenados em aparelhos celulares podem ser acessados pelas autoridades policiais sem decisão judicial.
O caso originou-se no Rio de Janeiro, quando um homem acusado de roubo deixou cair seu celular na cena do crime. O aparelho foi recolhido pela vítima e entregue à polícia, que acessou, sem autorização judicial, a lista de contatos e o histórico de ligações. Com base nessas informações, o suspeito foi identificado, preso e condenado em primeiro grau.
Em apelação, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) reformou a sentença e absolveu o réu, entendendo que houve violação da proteção constitucional ao sigilo de dados, já que a polícia não estaria autorizada a acessar as informações gravadas no aparelho sem autorização judicial.
O debate central
A discussão gira em torno de dois pontos principais: se é necessária uma decisão judicial fundamentada para acessar dados em celulares apreendidos, ou se as polícias têm autonomia funcional para acessar esses dados, prescindindo de autorização judicial.
O ex-procurador-geral da República, Augusto Aras, manifestou-se no caso defendendo que a autoridade policial poderia acessar livremente os registros telefônicos e outros dados gravados sem autorização judicial.
Impacto nos direitos fundamentais
O julgamento deste caso terá reflexos em pelo menos três grupos de direitos fundamentais: privacidade comunicacional, proteção de dados, e ampla defesa, incluindo o princípio do nemo tenetur se detegere (não produzir prova contra si mesmo).
Se o STF decidir pela autonomia funcional das polícias, surge a necessidade de um novo direito fundamental: o aviso sobre direito cibernético-digital de proteção de dados, semelhante ao aviso de Miranda nos Estados Unidos.
Uma nova garantia
Assim como o direito ao silêncio, o cidadão investigado deveria ser previamente informado de que não tem obrigação de fornecer senhas ou informações sobre seus dispositivos informáticos. Esse direito poderia ser reconhecido por mutação constitucional, ampliando o alcance do artigo 5°, inciso LXIII da Constituição, ou por emenda constitucional.
A proposta é que, ao ser abordado por qualquer polícia nas etapas pré-investigativa ou investigativa, a pessoa receba previamente o aviso de direito cibernético-digital de proteção de dados, garantindo sua liberdade de escolha sobre fornecer ou não as senhas de acesso e demais informações de seus equipamentos tecnológicos.