Apesar de ter aumentado muito nas últimas duas décadas, a assistência judiciária gratuita no Brasil – que é feita por meio das Defensorias Públicas da União, dos estados e do Distrito Federal – ainda apresenta significativas falhas, deixando 41% da população brasileira com direito a esse serviço sem assistência. As pessoas que recebem até três salários mínimos por mês têm direito por lei ao sistema de Justiça gratuito para atuar em sua defesa, assim como na garantia ou reivindicação de seus direitos, porém, não conseguem acessá-lo.
Segundo pesquisa realizada a partir de dados coletados por diversos órgãos em todo o país, o atendimento das defensorias públicas, que em 2021 era de 47% do total de brasileiros, subiu 12,1% nos últimos três anos. Hoje, os defensores atendem 59,1% da população. Mesmo assim, essa cobertura é insuficiente em 15 estados, onde as defensorias não atendem em todas as comarcas.
Existem atualmente, em todo o país, 7.413 defensores públicos, segundo o levantamento feito a partir de dados coletados pelo Conselho Nacional dos Corregedores Gerais (CNCG), Colégio Nacional dos Defensores Públicos Gerais (Condege), Defensoria Pública da União (DPU) e Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Federais (Anadef).
Considerando-se dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de que aproximadamente 178 milhões de pessoas no Brasil sobrevivem com menos de três salários mínimos por mês — número que chega a perto de 88% da população — a quantidade de defensores deveria ser bem maior. A carência impacta diretamente o atendimento das defensorias públicas.
Mas o problema não está apenas nisso. O levantamento constatou também que a cobertura das defensorias, que deveria ser feita em todas as comarcas do país, é considerada suficiente apenas em 10 estados – Acre, Alagoas, Amapá, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima e Tocantins – e no Distrito Federal. Nas demais unidades da federação, não chega a todas as comarcas.
Orçamento apertado
Pesa sobre a questão, a falta de investimentos orçamentários. De acordo com o estudo, para garantir o acesso igualitário à Justiça, toda defensoria pública depende do repasse de recursos suficientes para o adequado desempenho de suas funções constitucionais. Mas o orçamento aprovado para as defensorias públicas do país no ano de 2024 corresponde a apenas 0,24% do orçamento fiscal total das respectivas unidades federativas. Na prática, o cálculo revela que a cada R$ 100,00 do orçamento fiscal, apenas R$ 0,24 são destinados à Defensoria Pública.
A pesquisa também aborda um tópico que é relativamente novo na literatura sobre acesso à Justiça. Num país com tantas diversidades e desigualdades sociais, os dados levantados mostraram que 27,5% dos defensores públicos provêm de famílias com renda entre 10 a 20 salários mínimos e 26,4% advêm de famílias com renda acima de 20 salários mínimos. Esses resultados mostram que os mais privilegiados possuem muito mais propensão para serem aprovados em concursos e se tornarem defensores públicos.
O mesmo padrão foi encontrado ao analisar cor / raça / etnia: 74% dos defensores públicos são brancos, enquanto a população brasileira é predominantemente composta por indivíduos pardos. “Essas constatações não desafiam os ideais e o compromisso da Defensoria Pública no Brasil, mas sugerem que há trabalho a ser feito para garantir acesso e valorizar significativamente a diversidade”, destaca a publicação.