O Ministério Público Federal (MPF) apresentou recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça contra decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF 5) que negou seguimento a uma ação penal contra Sari Corte Real, ex-primeira dama de Tamandaré (PE). O caso está relacionado à morte do menino Miguel Otávio da Silva, de cinco anos, ocorrida em 2020 no Recife (PE).
Na ocasião, a mãe de Miguel, Mirtes Renata Santana – que trabalhava como empregada doméstica na casa de Sari Corte Real — levou os cachorros para passear e deixou a criança sob a responsabilidade da patroa, que não apenas permitiu a saída do menino do apartamento sozinho como acionou o botão do elevador para que Miguel subisse até a cobertura do edifício, de onde caíu.
Além de ter sido condenada a oito anos e meio de prisão por abandono de incapaz com resultado de morte, em 2022, Sari foi indiciada como ré em outro processo no qual foi acusada de ter mantido, no período em que o marido exerceu o cargo de prefeito, três empregadas domésticas em sua residência pagas mediante contratos firmados como servidoras do município, sendo que elas nunca apareceram na prefeitura (Mirtes e outras duas pessoas).
Apesar de comprovada a fraude, os desembargadores do TRF 5 consideraram que a ex-primeira-dama “não pode responder por desvio de verbas públicas apenas pelo fato de ser esposa do então prefeito de Tamandaré, Sérgio Hacker Côrte Real”. O ex-prefeito já responde a uma ação penal em que é acusado de ter contratado ilicitamente as trabalhadoras para prestação de serviços na casa da família.
O tribunal reconheceu que houve conduta irregular atribuída a Sarí na prestação de auxílio para que suas empregadas domésticas passassem a ser remuneradas pela Prefeitura de Tamandaré. Mas considerou que “a prática ilícita ocorreu exclusivamente no âmbito doméstico, em que não seria esperado que a ex-primeira dama tivesse autoridade ou pudesse discordar de seu esposo”.
O recurso sobre o caso foi interposto no final do ano junto ao STJ. Nele, a procuradora regional da República Acácia Suassuna destaca que a acusação contra Sarí “não se deu pelo fato de ser esposa do então prefeito, mas pela sua participação na execução do crime de contratação irregular de servidoras da prefeitura”.
O MPF também argumenta no recurso que a linha de raciocínio do TRF5 subverte o objetivo do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça. “Pois, além de colocar a mulher em uma posição de submissão exclusivamente com base em estereótipos de gênero, retira injustificadamente a credibilidade dos depoimentos das ex-empregadas domésticas, vítimas da fraude contratual e do racismo estrutural na relação de trabalho”, enfatiza.