Na retomada do julgamento da denúncia contra o chamado “núcleo crucial”, que tem oito acusados, entre eles, o ex-presidente Jair Bolsonaro, os ministros da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal analisaram as questões preliminares que são discutidas antes do mérito. Os ministros rejeitaram todas as preliminares e marcaram para esta quarta-feira, às 9h30, o julgamento do mérito da denúncia. Veja quais foram as preliminares.
1 – Impedimento ou suspeição do relator e ausência de parcialidade dos ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin
O ministro relator Alexandre de Moraes, primeiro a se manifestar, afastou o pedido e afirmou que o plenário já havia negado a preliminar. O ministro Flávio Dino também considerou que não há lastro constitucional e acompanhou o relator.
“Há uma tentativa de transformar os tribunais em uma polarização”.
O ministro Luiz Fux seguiu na mesma linha. Ele sustentou que “o fato de Moraes ter atuado com tanta exação e competência é motivo de elogio e não motivo para afastá-lo do processo. Eu rejeito a alegação”.
A ministra Cármen Lúcia afirmou que a indicação de parcialidade alegada pelas defesas “parece não ter qualquer comprovação”.
“Todos os elementos para dizer que os juízes são imparciais, a menos que se prove comportamento contrário, que não se tem nesse caso, não há porque se afastar em nome de uma possível desconfiança de alguém”, afirmou.
2 -Competência do STF e impugnação da 1° Turma
Ao negar a preliminar, Moraes lembrou que, em 1494 ações, o STF reafirmou a competência do Supremo para julgar os processos de 8/1. O ministro rebateu as alegações de que a maioria dos condenados são mulheres e idosos. Ele ressaltou que, das 1029 condenações, apenas 43 dos acusados têm mais de 60 anos.
“Essa narrativa que se criou e se repete através de notícias fraudulentas pelas redes sociais e fake news de que são mulheres e idosas, é totalmente mentirosa”, disse Moraes.
O ministro reforçou que, só nos casos relacionados à tentativa de golpe, a 1° Turma já julgou 168 ações. “Ou seja, o tratamento é igualitário a todos os acusados, a todos os denunciados, não se justifica nenhum tratamento diferenciado em relação a esse ou aquele acusado”, ressaltou o ministro.
O relator citou outros casos analisados pelas Turmas do STF como a denúncia envolvendo o senador Sérgio Moro (União Brasil). Moraes foi seguido pelos ministros Flávio Dino e Cristiano Zanin e pela ministra Cármen Lúcia.
O ministro Luiz Fux divergiu e acolheu a preliminar por entender que o caso deveria ser julgado pelo plenário. Ele afirmou que a questão que envolve o foro privilegiado não é pacífica no STF e já foi reexaminada pelo Tribunal várias vezes. “A questão de que inúmeras ações já foram julgadas não impede que amanhã ou depois se reflita”, afirmou.
3 – Nulidades
O ministro Alexandre de Moraes explicou que todos pedidos de nulidade se referem ao eventual ferimento do devido processo legal. Ele afastou inicialmente o pedido da defesa do general Heleno sobre a possibilidade de fatiamento da denúncia por violação da invisibilidade. Moraes ressaltou que o titular da denúncia é o Ministério Público, que denunciou todos aqueles que entendeu haver materialidade e autoria. Moraes afirmou que o julgamento da denúncia, apresentada em núcleos, não vai comprometer o contraditório e a ampla defesa.
“Não levará a decisões contraditórias porque o órgão julgador é o mesmo”, afirmou.
Cerceamento de defesa
Ao negar o pedido de nulidade por cerceamento de defesa, o relator destacou que os advogados dos denunciados fizeram inúmeros acessos aos autos. Disse ainda que, tanto a PGR, quanto os ministros e as defesas tiveram o mesmo acesso às provas nos processos.
O ministro esclareceu que, a partir do momento em que se recebe a denúncia e se abre a ação penal, quem tem que comprovar cada um dos fatos apontados é a PGR.
“Existindo uma dúvida razoável, a consequência é absolvição”.
Moraes reforçou que não se pode confundir uma investigação detalhada e complexa com documentos dump – informações excessivas e desnecessárias – como alegou a defesa de Bolsonaro.
Pesca predatória
Moraes também negou a alegação da defesa de Bolsonaro de que houve pesca predatória – quando se mira em uma pessoa, sem qualquer método específico, de forma aleatória. O relator lembrou que a investigação foi iniciada para apurar a existência de milícias digitais que atentam contra instituições e o Estado Democrático de Direito. Segundo Moraes, houve um desencadeamento da investigação e um levou a outro. Ressaltou que no curso das investigações não se pode ignorar outros crimes encontrados.
“O fato de a investigação ter se ramificado pelas provas corretas e licitamente apreendidas não se confunde com pesca predatória”, disse o ministro.
Os outros ministros da 1° Turma acompanharam o entendimento do relator.
4 – Aplicação das regras do juízo de Garantias
Em seu voto pela inaplicabilidade do juiz de garantias, o relator Alexandre de Moraes argumentou que o STF, por unanimidade, decidiu que as normas relativas aos juízes das garantias não se aplicam nos seguintes casos:
– processos de competência originárias dos tribunais
– processos de competência do tribunal de júri
– casos de violência doméstica e familiar
– casos de menor potencial ofensivo
Os ministros Cristiano Zanin, Flávio Dino e Cármen Lúcia seguiram o relator e também negaram o pedido.
5 – Nulidade ou validade da delação de Mauro Cid
Moraes reafirmou a validade do acordo de delação premiada. Citou que houve mais de uma vez a reiteração da voluntariedade do colaborador. A última, lembrou o ministro, foi da própria tribuna da 1° Turma, durante a sustentação oral, onde o advogado do tenente-coronel Mauro Cid disse que o colaborador cumpriu com a sua missão.
O ministro rebateu ainda as alegações de que Cid foi coagido a delatar, já que a oferta de acordo partiu da própria defesa do denunciado.
“Todos os atos de colaboração contaram desde o início com a presença e aval de seus defensores. Jamais a defesa constituída aceitaria qualquer espécie de coação ou induzimento na prestação de informações por Mauro Cid”, afirmou Moraes.
Na avaliação do ministro, a delação premiada não é uma prova, mas sim um meio de obtenção de prova, não devendo a denúncia ser baseada apenas nisso. Ele enfatizou que as cláusulas do acordo, estabelecidas pela Polícia Federal e pelo delator, permanecem até hoje.
Ao encerrar a analise dessa questão preliminar, Moraes enfatizou que todas as omissões da delação de Mauro Cid foram sanadas pelo delator. E reforçou que, em nenhum momento, o Supremo Tribunal Federal ou o relator interferiu nos termos da delação premiada.
O ministro Luiz Fux acompanhou o relator na questão da delação de Cid com ressalvas.
“Vejo com muita reserva nove delações de um mesmo colaborador a cada hora adicionando uma novidade. De sorte de, em se tratando desse momento, me reservo o direito de avaliar no momento próprio a legalidade e eficácia dessas delações sucessivas”.