O Superior Tribunal de Justiça decidiu que nos crimes contra a dignidade sexual podem ser aplicados simultaneamente dois artigos do Código Penal (CP): o 61 e o 226. O relator do processo, ministro Joel Ilan Paciornik, afirmou em seu voto que é possível a aplicação dos dois artigos porque o único ponto em comum entre ambos diz respeito à existência da relação de autoridade entre o autor do crime e a vítima.
O artigo 61 prevê – como agravante da pena nos crimes em geral – a circunstância de ter sido a conduta praticada com abuso de autoridade, ou prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou ainda com violência contra a mulher. Já o artigo 226 prevê aumento de pena em várias hipóteses de relação familiar ou de autoridade entre o agressor e a vítima.
A decisão do STJ segue o rito dos recursos repetitivos e, portanto, vale para todos os processos em tramitação sobre o tema no país.
Segundo o relator, no artigo referente à majoração da pena, o legislador enumerou algumas situações em que essa relação ocorre naturalmente. Enquanto no artigo que trata da agravante genérica do crime, está previsto que a circunstância de o crime ser cometido com abuso de autoridade sempre agrava a pena.
“Nessa hipótese, revela-se evidente a sobreposição de situações”, destacou o ministro.
Em um dos julgamentos sobre o tema, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu que a majorante específica do artigo 226 do CP não deveria ser considerada, porque a relação doméstica e o parentesco teriam sido valorados duas vezes de forma negativa.
Mas os integrantes da 3ª seção do STJ votaram conforme o voto do ministro relator, segundo o qual “a circunstância de o crime ser cometido com prevalência das relações domésticas não se confunde com a relação de autoridade (ascendência) que o acusado possui sobre a vítima, razão pela qual inexiste bis in idem (termo referente à aplicação de duas penas sobre o mesmo crime) no caso concreto”. O processo não teve número divulgado porque tramita sob segredo de Justiça.