A deputada federal Bia Kicis (PL-DF) reagiu ao pedido de investigação feito contra ela por advogados do grupo Prerrogativas à Procuradoria-Geral da República (PGR). A parlamentar defende que suas declarações, feitas em sessão da Comissão de Constituição de Justiça (CCJ), sobre o ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) foram apenas apresentação de fatos, e não acusações infundadas como alega o grupo.
“Eu apenas apresentei fatos. Informei na CCJ que havia um ofício encaminhado à Mesa Diretora da Câmara informando uma decisão. E depois, um novo ofício com uma nova decisão”, argumentou. “É só fato”, disse.
A deputada explicou que antes da declaração, se informou devidamente: “Procurei me informar com os advogados se havia tido um novo julgamento. Já sabia que não tinha, mas, ainda assim, tive cuidado de ver com os advogados, que reafirmaram que não houve um novo julgamento. Essa nova decisão não foi submetida à turma”, disse ela à CNN Brasil.
“Então, a própria Mesa da Câmara reconheceu que recebeu o segundo documento e que simplesmente ignorou esse segundo documento. Ela deu atenção ao primeiro documento, que era válido”, completou a parlamentar.
Questão de imunidade parlamentar
A deputada também contestou a legitimidade do grupo Prerrogativas para apresentar a denúncia contra ela à PGR. “Crimes contra a honra somente o próprio interessado poderia representar contra mim. Quem tem prerrogativas que estão sendo violadas sou eu, que tenho imunidade parlamentar. Então, eu digo que esse grupo Prerrogativas só serve para violar prerrogativas”, atacou.
Em resposta, o coordenador do Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, reconheceu que o grupo não tem prerrogativa para representar diretamente e ressaltou que, justamente por isso, a estratégia foi denunciar o crime à PGR, para que o Ministério Público assuma a iniciativa de investigar.
Prerrogativas: as acusações são graves e infundadas
De acordo com o grupo Prerrogativas, que apresentou o pedido à Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Kicis, a parlamentar proferiu acusações que consideraram “graves” e “infundadas” contra ministros do Supremo Tribunal Federal durante a sessão da CCJ da Câmara realizada em 7 de maio de 2025.
No pedido, o Prerrogativas destacou que Bia Kicis acusou o ministro Alexandre de Moraes de praticar “adulteração de documentos e manipulação de julgamentos”. Para o grupo, essas declarações poderiam configurar, em tese, “crimes de calúnia e difamação qualificados, com agravantes previstos no Código Penal, considerando a função pública das vítimas e a ampla divulgação dos fatos”.
O coletivo argumentou que “os ataques ultrapassam os limites da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar, ao não se tratarem de crítica política legítima, mas sim de ofensas deliberadas à honra funcional de membros do Poder Judiciário”.
Segundo o grupo, trata-se de “conduta que compromete o decoro parlamentar, viola a separação de Poderes e fragiliza a confiança nas instituições democráticas”.
Além da denúncia, o grupo de advogados também requereu que a PGR solicite oficialmente a íntegra audiovisual e transcrita da sessão da CCJ, a fim de instruir eventual procedimento investigatório. O documento foi encaminhado ao procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, a quem cabe analisar os fatos e decidir sobre a instauração de um inquérito contra a deputada.
A Procuradoria-Geral da República ainda não se manifestou oficialmente sobre o pedido de investigação protocolado pelo grupo Prerrogativas contra a deputada.
Para entender o embate
As declarações de Bia Kicis ocorreram em um contexto de tensão entre o Legislativo e o Judiciário envolvendo o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo Bolsonaro, é um dos réus da ação que investiga uma suposta trama golpista. Ele foi acusado de usar a estrutura da Abin para monitorar ilegalmente desafetos políticos, no caso que ficou conhecido como “Abin Paralela”.
No início de maio, a Câmara dos Deputados aprovou uma resolução para suspender integralmente o processo contra Ramagem. No entanto, a Primeira Turma do STF, por unanimidade, decidiu que a suspensão só poderia valer para crimes supostamente praticados após a diplomação do parlamentar, em dezembro de 2022, e não para todas as acusações.
Dessa forma, Ramagem continuaria respondendo por três dos cinco crimes imputados pela Procuradoria-Geral da República: organização criminosa armada, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. A suspensão valeria apenas para os crimes de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Foi neste contexto de discussão sobre as competências e limites entre poderes que Bia Kicis, ao contraditar uma questão de ordem do líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), afirmou que “houve uma alteração do julgado” e que Moraes estaria “adulterando, manipulando uma decisão judicial”, sem submeter a alteração do seu voto à Primeira Turma do STF.
Perfil da parlamentar
Beatriz Kicis Torrents de Sordi, conhecida como Bia Kicis, é uma advogada e política brasileira. Nascida em Resende (RJ), em 19 de setembro de 1961, foi eleita deputada federal pelo Distrito Federal em 2018, sendo a candidata mais votada da região na ocasião. Antes de ingressar na política, atuou como procuradora do Distrito Federal até 2018.
Atualmente, Kicis é líder da minoria na Câmara dos Deputados e integra a oposição ao governo Lula. Durante seu mandato, tem protagonizado embates constantes com o STF, especialmente com o ministro Alexandre de Moraes.
Sua trajetória inclui diversos embates com o Poder Judiciário. Entre 2019 e 2023, a deputada moveu ao menos 11 ações judiciais, incluindo pedidos de retirada de publicações que considerava difamatórias, gerando debates sobre liberdade de imprensa e o uso do Judiciário por políticos.